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Queria que hoje fosse só mais um dia. Como os outros 4 de dezembro que me esqueci que dia era. Mais um dia que iria trabalhar, e quando voltasse, meio atrasado pela azáfama, teria um pequeno mar de gente á minha volta que faria questão de me lembrar que é tempo de comemorar a vitória que de ter passado mais um ano onde pertenço. Porque é isso que se deve comemorar. Rever o que passou e ficar feliz por ter aguentado o barco mais em mais uma viagem. Tão simples quanto isso. Deixei de embarcar em carreirismos vagos e ocos. Cheios de vitórias que não me pertencem nem nunca pertencerão. Cheios da hipocrisia dos sorrisos. Carregados de vidas enlatadas que se resignam ás decisões tomadas na inocência da juventude. A vida deve viver-se onde nos sentimos bem. Onde sentimos pertencer. Não é a cenoura na ponta da cana que nos deve fazer andar. Porque se olharmos para ela sem o eufemismo que a soberba nos põe nos olhos, vemos só uma cenoura, que tal como todas as cenouras, com o passar do tempo murcha e apodrece. E quando nos apercebemos disso já espezinhámos toda a horta que não vimos por só olharmos numa direção. Qualquer hora é boa para recomeçar. Não há horas certas. Qualquer uma serve para pensar. Olhar para dentro sem tabus e sem desculpas. Fazer aquela pergunta que dói: "O que é que eu estou a fazer?". E aí abandonar as travincas. Assumir os erros, perdoar-mo-nos e viver do coração. Queria que fosse só mais um 4 de dezembro em que não desperdiçava em vão momentos que não se voltam a viver. Momentos que são conquistas. Que celebro, não só a todos os 4 de dezembro, mas ao fim de cada dia que volto e caio nos abraços daqueles a quem, sem hesitação, entreguei a vida. Esta entrega, não é como aquela das frases feitas que impensadamente se juram de mãos no ar quando lá atrás nos mostraram a cenoura que apodreceu. É a real missão que nos faz viver. Não é a horta. É o jardim, que se cuida sem esperar nada em troca. Que regamos sem reservas, que tratamos quando alguma maleita o atinge e que nos faz inchar o peito quando o vemos florescer e fortalecer. Há momentos que nos fazem ver tudo isto. Mas depois como qualquer bom jumento, voltamos a olhar a ponta da cana e a focar na cenoura podre. Porque é difícil deixar de olhar depois de uma vida inteira. Mas estou ciente que a consciência é o primeiro passo de qualquer caminhada.
E amanhã é outro dia.
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